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Opinião: declaração de nova Guerra Fria de Mike Pompeo dificilmente convencerá aliados americanos

Fonte: Diário do Povo Online    27.07.2020 14h05

O secretário de Estado Mike Pompeo proferiu na passada quinta-feira um discurso onde apelou à cessação de “compromissos cegos” com a China. Ele instou o mundo livre a mudar a China, ou “a China mudar-nos-á”.

A posição reiterada de Washington contra Beijing deriva da tática da administração Trump de divergir a atenção pública de questões domésticas, visando aumentar as suas hipóteses de reeleição. A posição assertiva dos EUA sobre a China corporiza também a sua estratégia de longo prazo para com o país.

O objetivo mais urgente da administração de Donald Trump é reverter a sua atual posição desfavorável na campanha de reeleição devido à forma ineficaz com que respondeu à pandemia. A propagação da Covid-19 levou a uma inversão na economia americana. A taxa de aprovação do presidente Donald Trump está em queda. A sua administração não encontrou uma forma eficiente de conter a pandemia. Face a esta situação, a atual administração americana está fazendo uso do trunfo da China para distrair a insatisfação do público face ao combate ao vírus.

Embora nem todos no círculo estratégico americano acreditem que o país deva lançar uma nova Guerra Fria contra a China, eles estão na mesma página no que concerne à mudança da política americana para a China. Neste contexto, as forças anti-China, como Pompeo, procuram implementar uma postura mais dura para conter o país.

No entanto, os antagonistas da China na administração americana não irão reverter completamente as bases lançadas pelo ex-presidente Richard Nixon para as relações sino-americanas. Eles podem mudar o curso do compromisso para o confronto, mas as relações bilaterais envolvem várias camadas, como o intercâmbio econômico, interpessoal e os contatos ao mais alto nível. Estas variáveis não podem ser todas neutralizadas.

Washington pode impor algumas medidas duras para se afastar de Beijing em algumas áreas, como alta tecnologia, particularmente o 5G. Em termos de ciência e tecnologia, é evidente que a China tem vindo a aproximar-se recentemente. Os EUA consideram isso uma ameaça à sua liderança no setor.

Os EUA preparam-se para impor mais limitações no intercâmbio interpessoal com a China. Isto deve-se à crença americana de que a China está tirando proveito do sistema social e educacional “aberto” em benefício próprio.

Relativamente à economia, quem quer que assuma a presidência irá querer uma maior reciprocidade no comércio. O desacoplamento em setores industriais poderá se verificar.

Muitos meios de imprensa qualificaram o discurso de Pompeo como uma declaração de guerra contra a China.

Os EUA irão atrair os seus aliados para conter a China, colocando mais pressão sobre eles em questões de economia e segurança.

Os EUA continuarão também a enfatizar os valores democráticos com seus aliados, alegando que os países democráticos devem unir esforços com o campo dos EUA na luta contra a suposta tirania chinesa.

No entanto, não é realista formar hoje dois campos militares de confronto como ocorreu na Guerra Fria, pois a situação internacional sofreu grandes mudanças. Durante a Guerra Fria, os EUA e a União Soviética ficaram basicamente isolados um do outro na economia e no comércio. Mas as economias e o comércio da China e dos EUA estão profundamente interligados.

Ao longo dos anos, um progresso considerável na colaboração entre a China e os países europeus, parceiros próximos dos EUA, foi selado. Países do centro e do leste da Europa têm participado na iniciativa do Cinturão e Rota.

Dadas as atuais interações profundas entre a China e os aliados dos EUA, uma demanda abrupta para desacoplar de Pequim e ficar do lado de Washington seria irrealista para esses países, pois prejudicaria os interesses desses aliados ou parceiros.

Assim sendo, as tensões entre a China e os EUA aumentarão, já que Pompeo defendeu o fim do "compromisso cego" com a China. No entanto, uma nova Guerra Fria é improvável, e um pior cenário é mais provável em certas áreas regionais, como o Mar do Sul da China.

A política geral dos EUA em relação à China não mudará tão cedo, mesmo que o candidato democrata Joe Biden assuma o poder após as eleições de novembro. A competição continuará sendo o tema principal dos laços China-EUA. No entanto, Biden adotará abordagens diferentes, sendo um pouco mais racional.

Biden poderá retomar o intercâmbio interpessoal e os diálogos de alto nível com a China. Ele deverá querer manter os elos de comunicação com Beijing. Além disso, o Partido Democrata atribui particular importância à governança global e Biden já anunciou que reverteria a decisão de Trump de se retirar da OMS "no primeiro dia" se vencer a eleição.

Nessa altura, a China e os EUA terão mais margem de cooperação.

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