A presidente do Partido dos Trabalhadores (PT) do Brasil, a deputada Gleisi Hoffmann, criticou nesta quinta-feira as ações contra a soberania de seu país por parte dos Estados Unidos, depois que veio à tona que agências do governo norte-americano produziram, ao longo de cinco décadas, documentos internos e de espionagem sobre o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva.
Hoffmann referiu-se aos documentos obtidos legalmente nos Estados Unidos, através da Lei de acesso à informação daquele país, pelo escritor e jornalista Fernando Morais, biógrafo do presidente brasileiro, que confirmou nesta quinta-feira à Xinhua que diferentes organizações civis e militares americanas produziram pelo menos 819 documentos sobre Lula, incluindo relatórios ligados à espionagem, há décadas.
"Essas revelações do jornalista Fernando Morais são muito graves sobre a espionagem dos Estados Unidos no Brasil", disse Hoffmann em comunicado, no qual afirma que Lula foi monitorado ao longo de sua carreira sindical e política não só pela Agência de Inteligência norte-americana CIA ou pela Agência de Segurança Nacional (NSA), mas também por uma dezena de outros órgãos do governo de Washington.
Segundo a presidente do PT, essas revelações sobre os documentos produzidos contra Lula são um "ataque à soberania nacional" do Brasil.
Morais é autor de "Lula, Volume 1", livro em que conta a vida sindical e política do fundador do PT e três vezes presidente do Brasil, lançado em 2021 e traduzido para inglês, espanhol e chinês.
O jornal Folha de São Paulo publicou esta quinta-feira que o escritório de advocacia norte-americano Pogust Goodhead, que trabalha 'pro bono' para Morais nos Estados Unidos, conseguiu acessar documentos americanos produzidos sobre Lula, incluindo relatórios de inteligência.
Esses documentos farão parte do segundo volume da biografia de Lula que Morais, um dos principais autores de não-ficção da América Latina, está escrevendo, segundo ele antecipou à Xinhua.
"Começamos a solicitar esses documentos há 7 anos", disse Morais. Segundo ele, passou a buscar informações oficiais através dos mecanismos legais dos Estados Unidos depois de ter entrevistado o fundador do Wikileaks, o australiano Julian Assange.
"O presidente ainda estava preso quando consegui procurações para recolher em nome dele todos os registros existentes nas agências. Tem agência que, obviamente, não tinha nada, tipo a que cuida de entrada ilegal de alimento. Mas pedi de todas", disse Morais ao jornal Folha de São Paulo.
Até o momento, foram encontrados 613 documentos da CIA, 111 do Departamento de Estado, 49 da Agência de Inteligência de Defesa, 27 do Departamento de Defesa, 8 do Comando Sul do Exército dos Estados Unidos e do Comando Cibernético do Exército dos Estados Unidos.
"Não apenas agências civis, mas, por exemplo, o Comando Sul do Exército dos Estados Unidos baseado na Flórida, que é uma espécie de radar de vigilância para a região latino-americana. Havia arquivos sobre Lula, conversas ligadas à China, arquivos sobre Lula com conversas com a ex-presidente Dilma Rousseff e o presidente discutindo questões petrolíferas com os militares", disse o escritor.
O pedido feito envolve uma busca por documentos entre 1966, quando Lula ingressou como torneiro mecânico em uma fábrica, na região do chamado ABC Paulista, e tem início seu envolvimento com o sindicalismo, até 2019, quando estava preso.
Lula se tornou uma figura nacional no Brasil na década de 1970, quando assumiu a presidência do sindicato dos metalúrgicos (1975), liderou greves e foi preso por ordem da ditadura e depois, em 1980, ao fundar o Partido dos Trabalhadores.
O ex-torneiro mecânico governou o Brasil entre 2003 e 2010 e venceu novamente as eleições em 2022 para governar até 31 de dezembro de 2026.
"A importância do Brasil e o fato de o Brasil estar sendo governado por um presidente progressista de esquerda chamar a atenção dos Estados Unidos, não me surpreende porque os Estados Unidos têm 15 agências de vigilância civil e uma grande agência de vigilância militar ligada à do Departamento de Defesa", comentou Morais.
A espionagem dos Estados Unidos contra o Brasil teve um momento crítico em 2013, quando o ex-agente de inteligência Edward Snowden vazou documentos nos quais era revelado que a ex-presidente Dilma Rousseff (2011-2016) teve seu celular e iPad interceptados pela NSA.
Ministros ligados à área de segurança e a petrolífera estatal Petrobras também foram alvos de espionagem.