Rio de Janeiro, 6 jul (Xinhua) -- A música brasileira e os amantes da bossa nova em todo o mundo estão de luto pela morte neste sábado do cantor e compositor brasileiro João Gilberto, aos 88 anos, considerado o pai da bossa nova e um dos músicos mais influentes do século XX.

A notícia foi confirmada por seu filho João Marcelo Gilberto, que mora nos Estados Unidos, em uma mensagem nas redes sociais. "Meu pai morreu. Sua luta foi nobre, ele tentou manter a dignidade à luz da perda de sua soberania".

Conhecido pelo temperamento difícil, João Gilberto estava há décadas recluso, não dava entrevistas e não recebia ninguém em casa, a não ser familiares e pessoas muito próximas.

Amigos e parentes que estiveram no apartamento situado no Leblon, zona sul do Rio de Janeiro, disseram que sua atual mulher a moçambicana Maria do Céu e uma cuidadora estavam com ele na hora da morte. A causa do falecimento ainda não foi divulgada nem os detalhes do funeral.

João Gilberto de Prado Pereira de Oliveira nasceu em Juazeiro, no interior do estado da Bahia, em 1931. Com 18 anos mudou-se para Salvador, onde se tornou crooner da Rádio Sociedade da Bahia. Em 1950, mudou-se para o Rio de janeiro, onde tocou em alguns conjuntos musicais, mas foi expulso por indisciplina.

Deixou o Rio e viajou para Porto Alegre, sul do Brasil, e depois foi morar na casa da irmã, na cidade mineira de Diamantina, onde, reza a lenda, passava muitas horas tocando no banheiro por considerar que os azulejos lhe proporcionavam a acústica que precisava.

No final da década de 50, retornou ao Rio e fez amizade com um grupo de músicos e compositores oriundo da zona sul da cidade. Sua gravação em julho de 1958 de "Chega de Saudade", de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, é considerada por muitos o marco inicial da Bossa Nova, por seu novo estilo de tocar violão, com uma batida e uma harmonia diferentes e um canto suave que influenciou toda uma geração.

"Distribuída sem alarde nem expectativas dois meses depois, tinha um minuto e 59 segundos de duração. Mas nunca tão pouco tempo de música significou tanto - dividiu a cultura brasileira em antes e depois", destacou o jornalista Ruy Castro sobre o impacto da interpretação de João Gilberto para "Chega de Saudade".

Autor de vários livros sobre a história da Bossa Nova e seus personagens Ruy Castro destaca como a influência de João Gilberto não parou de crescer desde aquela época. "Sua descoberta por parte de músicos e cantores norte-americanos lhe garantiu um culto que começou em 1962 e nunca mais parou", afirma Castro em artigo publicado hoje na versão online do jornal Folha de São Paulo.

"Em 1964, João Gilberto lançou com o saxofonista americano Stan Getz, o álbum Getz/Gilberto que incluiu a versão de 'Garota de Ipanema', cantada junto com sua esposa, a cantora Astrud Gilberto se converteu no disco de jazz mais vendido da história", recorda Castro.

"De Peggy Lee e Doris Day, naqueles tempos, a Diana Krall e Stacey Kent, passando por Frank Sinatra, não houve um grande artista, vocal ou instrumental que não se deixasse influenciar por seu 'blend' de voz e violão", acrescentou Castro.

O cantor viveu seus últimos anos de maneira simples, isolado, em um apartamento no Rio, de onde não saia muito. Ele costumava pedir comida em um restaurante próximo de onde morava e vivia fora do olho do público. Sua última turnê pelo país foi em 2008, quando passou também uma derradeira vez em Salvador.

Durante os últimos anos, João Gilberto já com a saúde fragilizada se viu no meio de um conflito entre dois de seus três filhos e sua ex-mulher: João Marcelo, que teve com Astrud Gilberto, Bebel Gilberto, de seu segundo casamento com a também cantora Miúcha, falecida ano passado, e a terceira esposa, Claudia Faissol, 40 anos mais jovem que ele e mãe de Luisa, sua filha adolescente.

Bebel e João Marcelo acusaram Claudia Faissol de aproveitar-se da fragilidade do pai e provocar sua ruína. No final de 2017, Bebel conseguiu uma interdição parcial do pai, ao alegar que ele já não tinha condições de cuidar de sua saúde nem de suas finanças devido a sua fragilidade física e mental.

Posteriormente Bebel e João Marcelo se desentenderam e estão brigando na Justiça.