Por Beatriz Cunha e Renato Lu
Este ano a China e o Brasil celebram 45 anos do estabelecimento das relações diplomáticas. Para esclarecer como o entendimento entre os dois países tem ocorrido, o embaixador do Brasil na China, Paulo Estivallet de Mesquita, concedeu uma entrevista exclusiva para o Diário do Povo Online (DPO).
DPO: Recentemente foi noticiado na mídia chinesa que o Sr sempre desejou residir na China, isso procede?
Embaixador: É verdade, logo no início da minha carreira eu havia pedido para passar um período aqui, porém não tive sucesso naquela ocasião e acabou acontecendo quase já na etapa final da carreira. Mas eu sempre tive muito interesse pela China, sempre li muito a respeito.
DPO: Qual o seu maior interesse na China?
Embaixador: No período da faculdade eu comecei a me interessar muito por Ásia, e naquela época não havia sido possível vir à China. Isso era final dos anos 70 e início dos anos 80 e é claro que, para quem se interessa por Ásia, a China é um componente muito importante, uma das principais culturas aqui da região, razão pelo interesse que tive ao longo dos anos. A minha vinda coincidiu com esse período de grande expansão e de abertura da China.
DPO: Em 2019 a China e Brasil completam 45 anos do estabelecimento das relações diplomáticas. Como o Sr. Embaixador vê o desenvolvimento das relações bilaterais nesses 45 anos?
Embaixador: Quando as relações bilaterais foram estabelecidas em 1974, não havia praticamente nada. Os estabelecimentos de relações eram muito formais, variava de governo a governo, sem que houvesse densidade, em termo de fluxo de pessoas, ou de comércio. Com a vantagem, em comparação com outros países, de que não havia uma história pregressa negativa. Era uma página branca pra ser escrita a partir daquele momento.
Quando comparamos com a situação atual, passados os 45 anos, o comércio saiu de zero para a China se tornar o maior parceiro comercial do Brasil. O Brasil envia mais de um quarto de suas exportações para a China e se tornou também, num período mais recente, um grande investidor no Brasil.
Para China, por outro lado, o Brasil é um parceiro importante. O Brasil é o país com maior potencial de expansão de fornecimento de alimentos, e já é, nesse momento, um dos grandes produtores e exportadores de alimentos no mundo. Então essa vertente econômica de comércio e investimentos se tornou uma das grandes relações do mundo. Ou seja, é algo importante em termos globais.
Nesse período, de forma um pouco menos significativa, mas em comparação com o início, já também de grande importância, aumentaram os fluxos de turistas, de cultura, de interesse dos brasileiros no aprendizado do mandarim, de interesse dos chineses no aprendizado do português, então é uma relação que se estende para outras áreas.
Essas áreas ainda estão um pouco atrás do econômico e do comercial, e nós achamos que precisam ser desenvolvidas, adquirir uma dinâmica semelhante. Mas são áreas nas quais vemos, graças ao interesse mútuo da população dos dois países, que vem se desenvolvendo bastante e de forma positiva.
DPO: Este ano tem havido divergências sobre o desenvolvimento das relações comerciais China-Brasil. Como você vê o investimento da China no Brasil? Como estão as trocas econômicas e comerciais entre os dois países? O Sr tem alguma sugestão?
Embaixador: Não acredito que haja divergência sobre o relacionamento, existem divergências de perspectiva sobre temas específicos, mas as relações, propriamente ditas, se desenvolvem muito bem. E, em parte, elas se desenvolvem bem até mesmo pelas diferenças, ou seja, ganhamos com a existência de diferenças. Uma diferença clara é a complementaridade econômica. O fato de que o Brasil tem uma base produtiva diferente da chinesa faz com que o comércio seja mutuamente benéfico e ofereça oportunidades.
A China é um país que se tornou, nos últimos anos, um grande exportador de capital, tendo adquirido uma grande experiência também na área de desenvolvimento de infraestrutura. O Brasil é um país que precisa expandir a sua infraestrutura. Então, ao meu ver, tudo isso aponta para perspectivas muitos promissoras, em relação ao desenvolvimento do relacionamento e o investimento chinês, que nos últimos dois ou três anos tem sido muito intenso no Brasil e ele é muito bem-vindo.
É possível encontrar no Brasil um mercado com grande potencial, onde o governo tem se esforçado por aperfeiçoar o arcabouço regulatório, para que o investidor tenha perspectivas seguras, mas por outro lado, que ele também tenha que se adaptar à legislação local, a legislação brasileira, em termos de respeito ao meio ambiente, direitos trabalhistas e normas de concorrência.